Sobre o nosso último encontro... bom, vou procurar ser breve...
Caminhar – antes, só uma tarefa simples e quase automática; agora, uma habilidade quase complexa que requer atenção. Músculos e articulações, vários sistemas sensoriais, forças gravitacionais. Então mais uma vez vamos com o nosso mestre para praça ao lado da ELT – Caminhar. Edgar nos propõe exercita-la consciente e consciente da sabedoria natural do corpo. Num círculo constante, caminhando chega-nos ao ouvido a voz do mestre, reiterando e nos recordando dos princípios: o fluxo, o centro (plexo), a bacia que leva, e o corpo em seu eixo acompanha, enraizar para crescer, massagem nos ombros, afim de nos liberar das toxinas orgânicas. Ultimamente este tem sido nosso ponto de partida, e voltar ao ponto de partida, evidencia novas perspectivas para os que regressam.
Próximo passo – salto em duplas, preparamos a base; o apoio, para que nossos meninos e meninas possam saltitantes riscar seus traços no céu – exercício que se dá em revezamento (Salta-se e se é apoio; nesta seqüência, repetimos por 3 vezes com parceiros diferentes). Após, vamos para briga de galo - jogo - estabelece-se a relação com o parceiro/adversário, concentração, e a figura presente no corpo – dança. E nesta dança , estabelecemos uma distância segura do outro e atacamos com o centro do peito - externo; Edgar nos alerta pra qualidade e verdade da relação e dos ataques, além do cuidado com o corpo, as tensões durante a dança e o bom uso da energia. Por fim, ainda na praça, vamos pintar o oito - não é, Yume! O símbolo é do infinito, um oito na horizontal, e com os pincéis nas mãos, que devem permanecer próximas, o impulso parte da bacia, integrados bacia, braços, mãos – pincéis – corpo, vamos desenhando – repetimos duas vezes e entramos no galpão.
Apresenta-se o protocolo da última aula, ocasião especial, foram dois.
O Mestre convidou nosso “coleguinha” Gê para comentar um texto – Bolês, do Máximo Górki. Tal texto inusitado que ele generosamente dividiu e se dividiu conosco. “Pois é... Quanto mais o ser humano provou do amargo, tanto mais ardente é a sua ânsia pelo doce.” Edgar evidenciou esta frase e comentou um caso particular, onde recorreu a um antropósofo (A antroposofia – ciência espiritual, foi desenvolvida por Rudolf Steiner, citou-o para quem quisesse saber mais sobre) e disse que os opostos complementares geram o equilíbrio. A bipolaridade é uma sabedoria natural humana. Mais um estímulo para pensarmos sobre a existência da luz e da sombra no humano, no demasiado humano.
E atenta a sugestão do mestre para lermos poesia, compartilho aqui um fragmento:
A fonte da Arte
“É isso apenas isso e o demais são
a morte e a nascença dos contrários a
fórmula da ternura e do sossego
abismo de ameaças nos teus olhos
regiões insondáveis e inacessíveis
pequeníssimas flores da memória
relâmpago dourado do olhar.”
(Ruy Belo – Despeço-me da terra da alegria)
Voltamos ao exercício – Eixo Predominante – combustível para improvisação. Desta vez refizemos a segunda proposta (dada por um dos grupos, no primeiro momento do exercício) – O velório, conflito: venda e partilha dos bens. Em grupos de cinco improvisamos, imprimimos nossos olhares e passamos a “personagem” para o próximo.
E a partir disto, Edgar escolhe duplas para executar sua proposta: Improvisação a partir do conflito entre dois irmãos, pós venda do imóvel, na casa do pai falecido, nesta casa restou apenas sua poltrona. Tempo para combinação, intervalo e segue-se as apresentações.
Por fim, nossa roda de diálogo: o mestre nos permiti colocações, observações sobre as cenas, fala-se e fala-se... E quando este toma a palavra diz: - Achei que as cenas caíram de qualidade. E faz agora suas observações de cada dupla. Eis algumas de suas colocações:
O ator deve exercitar aquilo que lhe é frágil para não se limitar. Desenvolver instrumental para trabalho.
Gerar internamente estímulo emocional da personagem para emanar os sinais. É preciso que o corpo esteja disponível para irradiar comunicação e não se pode deixar que esta comunicação se coloque no ator – um paradoxo – energias contrárias em movimento - A intensidade está acontecendo na sutileza. Agitar não é agir.
A personagem deve se movimentar, transformar. Para ser completa, deve-se mostrar outros aspectos (luz e sombra), contradição viva. É preciso buscar camadas da personagem, diversidade de sensações, essas variações compõem o ser humano e os fazem interessantes, mostrar o movimento na cena é algo desejável para o ator. E como não dar informações diretas? Fazer as pessoas entenderem falando pelas bordas? E ainda, ressalta a necessidade de ampliar o espaço vital, ocupar o espaço com a presenças e se relacionar com o espaço onde se está.
É... acho que consegui ser breve e sucinta... e já que é assim, encerro o desfecho com Fernando Pessoa – Álvaro de Campos.
Ah, Perante
“Ah, perante esta única realidade, que é o mistério,
Perante esta única realidade terrível — a de haver uma realidade,
Perante este horrível ser que é haver ser,
Perante este abismo de existir um abismo,
Este abismo de a existência de tudo ser um abismo,
Ser um abismo por simplesmente ser,
Por poder ser,
Por haver ser!"
(...)
Cláudia de Oliveira
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